Disponibilização: quinta-feira, 10 de junho de 2021
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano XIV - Edição 3295
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e no porta luvas do carro havia sacolinhas de supermercado de Pitangueiras, iguais às que estavam no local do furto.
Inicialmente, o acusado negou a prática do furto e disse que era de Pitangueiras, mas não soube explicar o que estava fazendo
no local, dando versões divergentes. Diante das evidências, ele acabou contando que tinha contratado dois indivíduos para
cortarem e retirarem os trilhos para subtração e que pagaria R$ 450,00 para cada um. Porém, na delegacia ele voltou atrás (cf.
mídia digital disponibilizada no SAJ a fls. 197). Também sob o crivo do contraditório, o Guarda Municipal EDMILSON SOUZA
DUTRA afirmou que participou da mesma diligência, prestando depoimento no mesmo sentido e corroborando a versão de seu
colega de farda. O CECOM informou sobre um possível furto de trilhos atrás da Granol. Foram até o local e entraram pela mata.
Avistaram trilhos cortados e a mata aberta. Ainda não tinham avistado ninguém. Porém, pouco depois viram duas pessoas
correndo. Mais adiante, encontraram maçarico, enxadão, garrafa de água, garrafa de café, luvas e outros petrechos utilizados
para fazer o corte dos trilhos. Seu colega Marcus Leandro avistou um Vectra preto a menos de dez metros. O condutor foi
abordado e revistado. Com ele havia R$ 900,00. No carro dele havia sacolinhas de um supermercado de Pitangueiras, iguais as
que acharam junto aos materiais onde os trilhos estavam cortados. O acusado não soube dizer o que estava fazendo no local,
dando versões desencontradas. Na conversa, o acusado mudou sua versão e acabou admitindo que o dinheiro era para pagar
os meninos. Nas vestes do acusado e no veículo dele havia resquícios de material do corte dos trilhos (cf. mídia digital
disponibilizada no SAJ a fls. 197). Nesse contexto, assiste razão ao Ministério Público ao sustentar que vê-se, pois, que as
provas recaem diretamente sobre o acusado, o apontando como um dos autores do crime. Os inúmeros indícios, se somados,
também constituem valoroso elemento de prova em desfavor do acusado. Não se pode negar o valor da prova indiciária, na
hipótese reconhecida pelo sistema do livre convencimento e adotada pelo Código de Processo Penal (artigos 155 e 239), sendo
inadmissível o desprezo às regras de experiência comum (RT, 673/357, 744/602, 758/583, 769/602 e 823/506), acrescentando
que a reunião de todos os indícios leva-nos a uma certeza: o acusado estava tentando furtar os trilhos de trem (cf. fls. 208). É
sempre bom lembrar, posto que aplicável ao caso concreto, o consagrado entendimento jurisprudencial no sentido de que nos
crimes contra o patrimônio, a palavra de uma vítima, quando coerente com as circunstâncias em que o crime foi perpetrado e o
modus operandi utilizado pelo agente, assume preponderância e autoriza a condenação (cf. RJDTACRIM 26/173). E, conforme
reiterado pela jurisprudência, a palavra dos agentes de segurança pública que atuaram na ocorrência não deve ser vista com
ressalvas quando não afastada a credibilidade por outras provas, já que eles são agentes do Estado, servindo justamente para
afastar a criminalidade e não há nada nos autos que indica que estão imputando falsamente a conduta. No mais, afasta-se a
incidência do princípio da insignificância penal postulada pela Defesa a fls. 216 em razão da orientação jurisprudencial firmada
no sentido de que sua aplicação pressupõe a concomitância de quatro vetores: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b)
nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) inexpressividade da
lesão jurídica provocada (STJ, AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 859.089 MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro). No caso
concreto, o acusado foi preso em flagrante pela prática de outro furto qualificado no dia 21.12.2020, com obtenção da liberdade
provisória em 22.12.2020, além de responder por outro crime de furto qualificado na Comarca de Viradouro (cf. certidão de fls.
243/244), voltando a ser preso em flagrante pela prática de furto qualificado, com rompimento de obstáculo e concurso de
pessoas, o que afasta a incidência do princípio da insignificância cujo reconhecimento foi propugnado pela defesa, por mostrarse incompatível com a conduta social do acusado, ao que se somam as qualificadoras do art. 155, § 4º, I e IV, do Código Penal,
a denotar maior reprovabilidade da conduta e periculosidade social da ação. Igualmente, não se sustenta a alegação de que o
acusado teria se limitado aos atos preparatórios, uma vez que os trilhos da linha férrea já estavam cortados e separados, a
denotar que já haviam sido iniciados os atos de execução do crime de furto, ou seja, já havia sido iniciada a caminhada para a
consumação do delito. A materialidade do crime ficou demonstrada pelos autos de exibição e apreensão de fls. 13/14, pelo auto
de avaliação de fls. 24 e de pelo auto de entrega de fls. 22, em consonância com as palavras da vítima e das testemunhas e
pelo boletim de ocorrência. A qualificadora do rompimento de obstáculo ficou demonstrada pelo laudo de exame pericial,
apontando que alguns dos trilhos da linha férrea já estavam segmentados (fls. 147/152), e o concurso de agentes ficou
demonstrado pelas palavras dos agentes de segurança pública que atuaram na diligência e visualizaram ao menos três pessoas
no local. Nesse contexto, a versão do acusado restou isolada nos autos e não convence, não existindo nenhuma prova indicativa
da situação de inocência por ele proclamada, ao que se soma a ausência de comprovação das alegações de que estaria indo
levar o dinheiro da pensão para sua ex-mulher quando foi abordado pelos guardas. E, consoante entendimento jurisprudencial
já sedimentado, ao Juiz sempre há de ser lícito decidir, também, por força de indícios ou presunções, na medida em que sejam
eles veementes, convincentes e inconciliáveis com outra solução diversa da adotada. Sustentar o contrário seria consagrar a
impunidade de um sem número de delitos, que reclamam reprimenda e que estão evidenciados, no que respeita à autoria e ao
elemento subjetivo, por dados outros que não a prova direta (cf. JTACrSP-Lex 92/218). Portanto, o conjunto probatório acima
retratado deixa isoladas nos autos as versões apresentadas nos interrogatórios judiciais, uma vez que a prova produzida sob o
crivo do contraditório estabeleceu indícios harmônicos e concatenados, veementes, convincentes e inconciliáveis com outra
vertente explicativa das circunstâncias exteriores que envolveram a realização do furto qualificado tentado imputado na
denúncia. Assim, restaram comprovadas nos autos a autoria e a materialidade do crime, corroborada por outros elementos
seguros de prova oriundos do contraditório e com incidência das circunstâncias agravantes previstas no art. 155, § 4º, I e IV do
Código Penal. Contudo, a jurisprudência já firmou entendimento no sentido de que concorrendo várias qualificadoras em um
mesmo crime haverá uma só incidência; a outra ou as outras, servirão de circunstâncias agravantes quando enquadráveis nas
hipóteses legais. Nesse contexto, nada obstante a comprovação de duas causas especiais de aumento, haverá uma só
incidência, sem aproveitamento da outra como agravante por ausência de enquadramento legal. Sob tal conjuntura probatória,
inafastável o desfecho condenatório, razão pela qual passa-se à dosimetria da pena. Na primeira fase da dosimetria da pena, as
circunstâncias judiciais são desfavoráveis ao acusado, diante do reiterado e constante envolvimento com crimes contra o
patrimônio, ao que se soma o fato de que estava em liberdade provisória quando foi preso em flagrante pelo crime apurado
nestes autos (cf. certidão de fls. 243/244), razão pela qual a pena-base será fixada acima do mínimo legal em 1/6 (um sexto),
perfazendo 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa, de valor unitário mínimo. Na
segunda fase de aplicação da pena, não há circunstâncias atenuantes ou agravantes, razão pela qual a pena fica mantida em 2
(dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa, de valor unitário mínimo. Na terceira fase,
diante das causas de aumento do concurso de agentes e do rompimento de obstáculos, a pena será acrescida de 1/3, perfazendo,
portanto, 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, de valor unitário
mínimo. Igualmente, aplica-se na terceira fase a causa de diminuição decorrente da tentativa, razão pela qual a pena será
diminuída de um terço em face das circunstâncias da própria tentativa, caracterizadas pelo menor distanciamento entre o início
da execução e a meta optata, perfazendo 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 11 (onze) dias-multa, de
valor unitário mínimo. Não há nos autos qualquer elemento que indique ser o acusado financeiramente abastado, motivo pelo
qual fixo para cada dia multa o valor equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente à época do crime. Pelo exposto, julgo
procedente a ação penal e condeno o réu MAELSON DA SILVA SANTOS, como incurso no art. 155, § 4º, I e IV, c.c o art. 14, II,
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º